COMENTÁRIO DA LIÇÃO - IASD Central de Campinas

COMENTÁRIO DA LIÇÃO

Lição 11- O Caminho do vento

Uma das características da sabedoria de Salomão evidenciava-se na virtude de distinguir o bem do mal, conforme atesta o relato bíblico. Mas outro aspecto distintivo dessa qua-lidade era a capacidade de armazenar conhecimentos sobre os diversos seres e fenômenos da natureza, a ponto de ser admira-do pelos mais insignes homens de ciência daquela época. Mesmo assim, e apesar desse vasto conhecimento que repre-sentava um sinal de grandeza, Salomão reconheceu sua peque-nez ao comparar seu saber com os mistérios da sabedoria cria-dora de Deus. Nessa comparação, usando linguagem figurada, o “Pregador” procura transmitir o nível de ignorância do saber humano em relação à ciência Divina. Então, utilizando o recur-so gramatical do grau, ele afirma: “Assim como tu não sabes qual o caminho do vento, … também não sabes as obras de Deus, que faz todas as coisas” (Ec 11:5).

Num mundo de alta tecnologia e de domínio de recur-sos da sofisticada eletrônica, pareceria difícil confirmar a afir-mação de Salomão. Na atualidade, o homem conta com o au-xílio de anemômetros, anemoscópios e outros aparelhos sutis, fazendo parecer que o “caminho dos ventos” já está traçado em cartógrafos específicos. Especialistas em meteorologia ou em eólica são capazes de identificar os ventos pela sua origem, intensidade, velocidade e direção. Mas como eles mesmos afirmam, toda previsão é uma tentativa de estimar as caracte-rísticas e, sobretudo, os efeitos dos ventos. Qual é o “caminho do vento”? Só Deus o sabe.

A insinuação de Salomão em relação ao “caminho do vento” não era unicamente uma tentativa superficial de compa-rar o conhecimento do homem com o saber de Deus. Mais do que isso, era reconhecer que só Deus sabe o futuro da existên-cia de cada pessoa. Com essa visão, o autor do texto deseja exortar os jovens a considerar a vida futura. Sua alocução faz referência direta à alegria como principal característica dessa fase da vida da pessoa humana. Nessa expressão, a alegria deve ser entendida como manifestação de felicidade.

A proposta salomônica de gozar a vida na fase da ju-ventude inclui a escolha da real e única forma de felicidade que concede méritos de enfrentar o juízo eterno. Essa classe de felicidade é aquela que segue as orientações e princípios divi-nos de vida, com projeções para a vida eterna. Uma dessas orientações, o autor aponta como exemplo, é a prática da soli-dariedade com os menos favorecidos. O autor sugere o desem-penho dessa prática com palavras que representam a idéia que ele mesmo deseja plasmar. Assim, a frase determina lançar “o pão para as águas”. Esse ato, garante o autor, terá conseqüência positivas.

Com a apresentação alegórica sobre a prática da solida-riedade, Salomão pretende estimular e ampliar outras ativida-des que conduzam à obtenção dos mesmos resultados. A tarefa, no entanto, não é fácil. Há obstáculos representados por “nu-vens”, “árvores caídas”, “trevas”; mas… há também um sus-pense. O autor, nesse momento, conduz a mente dos seus ou-vintes para o poder auxiliador de Deus. Deseja que sejam con-sideradas as “obras de Deus”, clara demonstração do Seu po-der. Com essa ajuda, a juventude será um estágio em que as práticas de vida serão meritórias e, em tom familiar, exorta a não omitir esse poder e nem esquecer que: “de todas estas coi-sas, Deus te pedirá contas” (Ec 11:9).

Lançando o pão

“Lança o teu pão sobre as águas, porque depois de muitos dias o acharás” (Ec 11:1). Essa frase parece ter sido popular em nações do Antigo Oriente Médio. Foram encontra-dos alguns “tabletes” de argila com escrita cuneiforme, onde aparece uma versão semelhante àquela expressa no verso apre-sentado. Considerando a popularidade da frase no ambiente daquela época, a mesma sentença pode ser interpretada como referência à diversidade de atividades promovidas pelo ho-mem, as quais dão seus resultados depois de vários dias. A extensão dos dias de espera deve-se à necessidade de vencer os obstáculos, as tribulações da vida, representadas pelas águas. Se é esse o pensamento do autor de Eclesiastes, podemos infe-rir que ele não estava interessado em detalhes sobre a execução de práticas isoladas. Seu interesse era considerar a vida como um todo, ou seja, toda atividade humana está relacionada com outras e não independente delas; ao menos não deve assim ser considerada. A interdependência de atividades permite que o ser humano, como um todo, alcance finalmente o resultado esperado.

Conforme o parecer de muitos comentaristas bíblicos, outra forma de interpretar essa frase é reconhecer que o autor pretende estimular a prática da “caridade” ou manifestar soli-dariedade para com os que precisam. A palavra básica para assumir tal interpretação é “pão”. Em todas as línguas e em todas as épocas, o sustento ou fator alimentício, sempre foi representado por esse produto, comum em qualquer núcleo social ou familiar do planeta. A voz imperativa que dá início a essa frase: “Lança”, tem a finalidade de chamar a atenção à importância dessa prática.

A parte final da frase do verso que consideramos dá certeza do efeito de reciprocidade sobre o ato realizado. Passa-rá um determinado número de dias, tempo não definido, mas, finalmente, o “pão” lançado será recuperado. Isso significa que a generosidade é sempre retribuída. Mas a retribuição de um ato de caridade, quando executada para um necessitado, não é realizada com a participação de duas pessoas: o doador e o beneficiado. A caridade executada seguindo o mandato divino é um ato de retribuição que envolve a participação de Deus. O “pão”, objeto do ato de caridade, segue um roteiro triangular: O doador dá o beneficio para o necessitado; este retribui esse favor com ações de graças para Deus; finalmente o Ser Divino devolve o “pão” ao doador, em grande medida.

Uma última orientação na prática da caridade é encon-trada no verso seguinte: “Reparte com sete e ainda com oito…” (Ec 11:2). Na numerologia bíblica, a seqüência de números indica plenitude ou totalidade. Assim, o autor recomenda prati-car a caridade com todo objeto disponível e para todos.

Nuvens, chuva e destino

“Estando as nuvens cheias, derramam aguaceiro sobre a terra …” (Ec 11:3). A frase, embora concisa, não pode ter outro significado mais claro que as dificuldades da vida, desde os problemas particulares até as grandes calamidades de efeito coletivo. Salomão estimula essa interpretação e amplia a se-mântica dessas palavras ao manifestar o plano inexorável da natureza afetada pelo pecado. Então, ele afirma: “Caindo a árvore,… no lugar onde cair, ali ficará” (v. cit.). Essa sentença revela que as dificuldades podem ser de tal magnitude que para o homem é impossível removê-las.

Se as dificuldades da vida ostentam o caráter de estabi-lidade, poderá a ciência removê-las dando solução a todo pro-blema? O rei de Israel elimina essa esperança ao relatar o nível de conhecimento alcançado pelo homem. Mesmo após 30 sé-culos desde a época em que Salomão escrevia essas palavras, a ciência do homem ainda não sabe qual é “o caminho do vento” e explicitamente expõe sua ignorância diante do saber Divino. Essa condição faz com que o conhecimento alcançado pelo homem, obviamente declare sua incapacidade de remover as “arvores caídas” das dificuldades sociais.

Usando os recursos mais adequados da linguagem, Sa-lomão manifesta seu desejo de que o espectro desse panorama não venha a traumatizar os homens, principalmente os que buscam a verdadeira sabedoria. Para o “Pregador”, esse é o momento propício de exortar a todos quanto a confiar no poder de Deus. Bem sabe o rei de Israel que o homem investido com essa fé, pode vencer; então, ele é encorajado a realizar suas atividades apesar dos obstáculos, pois “quem somente observa o vento nunca semeará, e o que olha para as nuvens, nunca segará” (Ec 11:4).

O autor insiste no mesmo propósito declarando outro provérbio: “Semeia pela manhã a tua semente e à tarde não repouses a mão,…” (Ec 11:6). Essa frase pode indicar dedica-ção ao trabalho, apesar dos obstáculos, mas pode referir-se também a períodos da vida de uma pessoa. No antigo Israel, a manhã era uma representação da juventude, e a tarde, da matu-ridade ou velhice.

Dias da tua mocidade

“Alegra-te, jovem, na tua juventude, e recreie-se o teu coração nos dias da tua mocidade; anda pelos caminhos que satisfazem ao teu coração e agradam aos teus olhos…” (Ecl 11:9). Essas frases, ditas em qualquer período da história hu-mana, sempre terão o mesmo sentido. A juventude é identifi-cada por uma manifestação emotiva do ser: a alegria. Essa ale-gria se manifesta no coração, símbolo central da existência humana, e lugar em que se originam todos os desejos e aspira-ções.

Referindo-se ao jovem, no verso citado, Salomão usa o vocábulo hebraico que mais se adequa ao propósito que deseja emitir. Esse vocábulo é: bahur, que na conceituação hebraica dos tempos do A.T. refere-se ao período da vida de uma pessoa entre a adolescência e a maturidade. Nos textos bíblicos, o termo aparece registrado 45 vezes e, na sua maioria, relacionado com o estado de solteiro. O jovem, bahur, é caracterizado pela sua potencialidade tanto física como mental, e pode suportar difíceis provas, quando testado. O jovem apresenta um ambiente adequado para efetuar uma boa preparação para a vida. Isso significa que as melhores qualidades de caráter podem ser impressas nesse período. Outro sinal distintivo é a capacidade de revelar energia moral para enfrentar os perigos. Em termos de religiosidade, bahur é a idade propícia para assumir responsabilidades teologais, como o pecado. No livro Pirqué Abbot, “Ditos dos Pais”, o jovem, bahur, pode casar aos 18 anos.

Pelas anteriores peculiaridades impostas ao bahur, “jo-vem”, Salomão instiga os jovens, com palavras que soam como clara ironia, a realizar práticas que devem ser encaradas como prescrição adequada. “Alegra-te, jovem”, não é um convite a levar uma vida de liberalidade, em busca do prazer sem limites. Ao contrário, com as qualidades do bahur, alegrar-se significa experimentar a verdadeira felicidade, aquela que só gera satis-fação, sem sentimentos de dor nem pesar de consciência.

Qual é a verdadeira felicidade? A resposta é complexa, pois, para alguns, a felicidade está relacionada com a posse de bens materiais e para outros, com a satisfação que os prazeres proporcionam. Ainda para outros, a felicidade está relacionada com o desenvolvimento das virtudes. Aristóteles identifica a felicidade com a realização das melhores atividades, e uma dessas atividades é a sabedoria prática. Isso significa que a felicidade tem estreita relação com o fazer. Segundo Sto. Agostinho e Tomás de Aquino, o “fazer” produz dois tipos de felicidade: a felicidade bestial que é o “fazer” que proporciona satisfação temporal, e a felicidade eterna que se experimenta com o “fazer” que toma posse do Absoluto.

Os conceitos sobre felicidade referidos no parágrafo anterior, embora não sejam plenamente um ampliação ou re-flexo exato do sentido de felicidade exposto por Salomão, au-xiliam na compreensão da sentença final do texto: “sabe, po-rém, que de todas estas coisas Deus te pedirá contas” (v. cit). Em outras palavras, o rei de Israel apela aos jovens convidan-do-os a formar uma personalidade plena de felicidade nos pa-drões divinos.

Ruben Aguilar PhD
Professor de Teologia
UNASP, Engenheiro Coelho, SP

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